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MODELAGEM MATEMÁTICA: RE/CONSTRUÇÃO DE PERSPECTIVAS

Roberta Modesto Braga
Elizabeth Gomes Souza
Adilson Oliveira do Espírito Santo

ISBN: 978-65-5889-271-7
DOI: 10.46898/rfb.9786558892717

Presentation

Em primeiro lugar, e já agradecendo pelo privilégio de participar deste trabalho tão valioso e, em consequência, tão relevante! Além disso, sou um praticante inveterado de Modelagem Matemática tanto profissionalmente quanto em Educação Matemática. Bem, isso me coloca em dois contextos igualmente próximos de meu coração, ou de minha emoção e, portanto, de minhas convicções. Que vêm mudando ao longo dos anos, felizmente. Em muitos aspectos!
Em Modelagem Matemática, tanto profissionalmente quanto na Educação Matemática, minha experiência sempre tem sido a de que precisamos, inegavelmente, daquilo que é diferente, de quem faz de outro jeito, de quem usa diferentes instrumentos matemáticos e computacionais, de quem adota parâmetros diferentes, de quem pensa, fala e faz de modos diferentes! Uma possível ilustração se acha nesta obra, com diferentes visões do que é a modelagem matemática, de como descrevê-la, de como usá-la de onde tais visões e definições são necessárias, e com diferentes sugestões sobre o que é a Modelagem Matemática, diferentes práticas, diferentes usos... Um dos autores deste trabalho uma vez me afirmou, corrigindo minha suposição, do ponto de vista dele, que a Modelagem Matemática na Educação é um catalisador de um ambiente de aprendizagem – claro que nunca me esqueci da riqueza epistemológica que esta simples frase despertou em mim. Sendo eu uma pessoa que também trabalha profissionalmente com a Modelagem Matemática como práxis! Uma pessoa que, por essa atividade, considerava a Modelagem apenas como um ambiente de aprendizagem. O objetivo não é enfatizar que uma definição é melhor de algum modo do que outra e sim que as diferenças são sinérgicas. Mesmo porque as diferentes concepções nos servem em momentos diferentes, quando estas nos convêm...
Num trabalho paradigmático, Blum nos coloca uma diferença entre Aplicações Matemáticas e a Modelagem Matemática: enquanto aquela nasce na matemática e procura onde, fora da Matemática e, às vezes na própria Matemática, pode ser útil e relevante, esta nasce fora da Matemática, e traz uma situação-problema para a Matemática, na maior parte das vezes até sem alguma pergunta específica, para o universo matemático. E faz isso de modo quase sempre transdisciplinar. E nisso autoras e autores deste trabalho são sujeitos no aceitar desafios nascidos dos cotidianos de tantas comunidades em que se desenvolveram atividades. E leitoras e leitores se tornam, também, protagonistas no aprender, no aprender muito.
Assim, posso registrar subjetivamente, claro, a importância do primeiro capítulo reunindo o trabalho de Modelagem Matemática com Educação Ambiental: há tempos pude trabalhar com o Prof. Ademir D. Caldeira na elaboração de sua tese, intitulada (defendida em 1988): “Educação Matemática e Ambiental: uma concepção de mudança”. O texto aqui apresentado estimula pedagogicamente a Matemática do compromisso com a sociedade, com a natureza e com o futuro. A descrição cuidadosa do trabalho realizado deve ser um estímulo a outras experiências desse tipo em toda uma diversidade de situações, de níveis, de focos. Aliás, ambos os comentários se aplicam a tudo nesta obra: compromisso e estímulo: faça-se Modelagem Matemática porque nós precisamos fazê-lo! Para aprender Matemática, claro, mas, sobretudo, para aprender a “ler” o mundo e conhecer-lhe os problemas reais... E para descobrir que, como Matemáticos, temos muito a contribuir para mudar histórias.
No segundo trabalho, temos uma saudabilíssima apresentação das tecnologias nos anos mais adiantados de formação. Mas de tecnologia hodierna. Isso de usar lápis e papel e, assim, forçar raciocínio e compreensão, também usa tecnologia, considerando que, apesar do papel ser bem mais antigo, o lápis nos vem do décimo segundo século ou algo assim. Apesar das insistências de vantagens para o raciocínio, esta postura não investe num futuro consciente: e a Modelagem Matemática exige, sim, o que nós temos de melhor do ponto de vista tecnológico, também: precisamos usar todos os recursos que há quando comprometemo-nos com a sociedade e com a natureza.
Em seguida, no terceiro capítulo, temos uma importante contribuição, abordando Modelagem Matemática nos anos iniciais – algo que muitas e muitos docentes achavam que não seria viável e, nesse capítulo, os alunos são colocados como sujeitos de um processo de aprendizagem em contraposição a serem objetos de um procedimento de ensino. Isto é fundamental para uma educação consciente, colocando alunas e alunos numa posição de atores na aprendizagem – desde os anos iniciais de sua escolarização.
No quarto trabalho, apesar de levar em consideração um largo espectro em suas análises, destaca-se um importante ponto: a contextualização. Este termo é utilizado de modo bem mais abrangente do que se usa comumente: esta contextualização não se resume apenas ao entorno das situações-problema, mas a um entorno completo de um modo original e inovador: são os contextos das comunidades, do quadro pedagógico em que se dão as atividades, das ações de aprendizagem e crítica, de análise e avaliações.
De modo semelhante no aspecto da inovação, o quinto capítulo coloca os alunos, que são também professores e sujeitos de um esforço no socializar as muitas características das práticas docentes de professores indígenas, com uma crítica específica de um problema de matematização que se transforma numa consideração importantíssima sobre situações-problema descoladas da realidade efetiva dos alunos. Também aqui, o conceito de contextualização inclui, evidentemente, aspectos históricos, indispensáveis numa região de história e cultura marcantes. Escrito de outro modo, temos aqui uma importante observação, a de que a opção deve ser, de modo transdisciplinar, com situações que, para uma “leitura do mundo”, como nos ensina Paulo Freire, realmente venham a exigir matemática em seu estudo, sua análise, sua compreensão e suas propostas para uma melhoria da vida.
Logo em seguida, no sexto capítulo, numa fácil transição para considerações etnomatemáticas numa comunidade restrita e com relação às atividades comunitárias em tarefas específicas, que permitam a matemática em sua compreensão e avaliação tanto do ponto de vista de importantes detalhes quanto globalmente. É um texto que evidencia a proximidade de etnomatemática e modelagem matemática num sentido diferente daquele observado por Scandiuzzi (em obra referenciada no texto): um sentido matemático que inclui a sociedade como um todo e não apenas restrita a problemas ligados a grandes questões industriais ou situações de dominação, numa perspectiva de vinho e queijo, como afirmaram tão bem Rosa e Orey em obra também referenciada no texto.
O sétimo capítulo apresenta a importância do ambiente de Modelagem Matemática e sua prática no estudo dos sujeitos aprendedores. Aliás, é evidente esta postura em todo o livro: a presença de alunos como sujeitos de seu processo de aprender em vez de serem objetos do processo de ensinar do professor. Deste ponto de vista, numa situação específica de educação de jovens e adultos, pode-se ter uma ideia de como a Modelagem Matemática exige o aprender a praticar a matemática e a falta que esta prática faz e os problemas que esta falta cria na já mencionada “leitura do mundo”. A abordagem quantitativa, não obstante ter sido feita em um restrito grupo, permite considerações qualitativas quanto aos procedimentos no aprender por parte dos alunos, repito, considerado como sujeitos do aprender.
Logo a seguir, oitavo capítulo, há o relato de uma atividade de Modelagem Matemática de um fenômeno aparentemente não-matemático em que a proceder matemático permite a avaliação de diferentes resultados e usa a matemática numa escolha. O modelo tem, evidentemente, um caráter empírico, mas a modelagem e os resultados obtidos tornam os procedimentos adotados também heurísticos. Uma vantagem desta atividade é o de se ter trilhado um caminho que permite muitas outras abordagens de problemas em que uma crítica matemática permite uma escolha quantitativa.
O antepenúltimo, capítulo nove, nos coloca frente a frente com uma análise de como reagiram e como reagem alunos diante de uma situação-problema que exige dos alunos a coleta de informações, a socialização de reflexões sobre o problema, a crítica das possibilidades de continuação dos procedimentos de modelagem matemática. Esta postura, presente, em geral, no livro todo, evidencia aquilo que Freire designava como a construção dialógica de conhecimento. Embora uma análise quantitativa tenha sido feita com relação a uma atividade, o texto indica, como desafio, a possibilidade de se fazerem atividades afins, com novas ações, novas percepções, novas construções de conhecimento relacionadas a situações específicas nas comunidades de atuação dos docentes que, no curso, foram sujeitos-alunos.
No capítulo 10, o trabalho com situações do estudo e da aprendizagem de fenômenos ligados à física escolar, de um modo especial em termos pedagógicos, análises empíricas e heurísticas se combinam na construção de modelos matemáticos para a compreensão de fenômenos sentidos tanto individualmente quanto socialmente: como cita o próprio texto, “um tema [e uma situação-problema] ... do cotidiano do aluno, facilitando assim sua discussão. Uma prática de Modelagem Matemática em que esta surge, sim, e de modo relevante, como um instrumental matemático para, feita uma leitura do mundo, se construam conhecimentos criticando-os e usando-os a serviço de uma comunidade.
Finalmente, no 11º capítulo, um digno fecho para uma obra de alto nível: nessa parte do texto, há a abordagem de muitas das considerações em capítulos anteriores, de modo implícito na descrição de atividades de iniciação científica em um laboratório experimental de modelagem matemática. Estas atividades incluem o uso de artefatos e tecnologias, a análise de ambientes naturais, o dinamismo de uma ação em modelagem matemática e a presença do contraditório. Este é um aspecto fundamental da Modelagem Matemática.
Em algumas áreas de estudo e de produção de conhecimentos, ideias contraditórias levam a diferentes caminhos e posturas. Em modelagem matemática, porém, o diferente é necessário e é mais: fundamental na avaliação crítica de resultados, na escolha de instrumental matemático, nas orientações de futuras ações na sociedade e na natureza. Arriscando-me a uma expressão teórica, tomo a liberdade de afirmar que, na modelagem, o diálogo como o diferente é sinérgico, isto é, leva a resultados melhores para indivíduos em sua compreensão do mundo, em comunidades em seu empoderamento, na natureza em sua preservação, e em sociedade na mudança de sua história.
Creio ser esta lista um dos muitos ótimos resultados desta obra: este texto reafirma nossa desmedida ambição: a de mudar a nossa história, fazendo-o com a leitura do mundo, a construção dialógica do saber, a crítica desse saber e sua utilização a serviço da sociedade. Sim, uma ambição utópica, a única a valer a pena.
Considero este texto como uma obra de relevância maior e mais: não se constitui num término de trabalhos, mas na indicação de muitos pontos-de-partida para novas ações pedagógicas para uma aprendizagem significativa. Continuarei a me sentir honrado de ter podido escrever este prefácio, sobretudo na companhia de autores marcantes no desenvolvimento de ações, reflexões, sugestões que tornam o aprender transdisciplinar, como consta no penúltimo capítulo, uma “alavanca para mover o mundo”.
Tenham uma boa leitura – e sintam-se desafiadas e desafiados a trilhar estes caminhos... Não é fácil, mas como vale a pena!
João Frederico da Costa Azevedo Meyer

Publication date:

21 de janeiro de 2022 21:40:24

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